Por JANDIRA PEDROLLO
A compra de um eletroeletrônico ou de um móvel é motivo de alegria, ou mesmo de euforia, para a grande parte da população brasileira. Muitos, para adquirir o objeto de consumo, utilitário ou de lazer, passam inclusive por privações.
Porém, nem sempre a aquisição é de fato vantajosa, pois se tornou cada vez mais frequente o produto estragar ou ficar obsoleto logo após o vencimento da garantia. Esse tipo de prática tem até nome “obsolência programada”, que, quando mal programada, faz o objeto estragar antes mesmo que a garantia vença.
Há inclusive marcas de eletrônicos que são acusadas de utilizar esse tipo de estratégia em seus aparelhos para aumentar as vendas. Quando o produto estraga ainda na garantia, o consumidor sofre para fazer valer seus direitos, mas na maioria das vezes consegue solucionar.
O problema é quando já está fora do período da garantia e descobrimos que as peças de reposição são difíceis de conseguir, ou mesmo impossíveis, sem trocar um conjunto de peças. Um exemplo são as geladeiras que hoje têm durabilidade referente à parte elétrica baixíssima.
Quem é da minha época sabe, antigamente, trocávamos apenas a borracha das portas, mas hoje é preciso substituir a porta inteira. Ou seja, o produto até pode sair mais barato e bonito, mas é um risco. Essa mesma prática vale para uma infinidade de produtos eletrônicos e mobiliários.
Neste contexto, como fica a consciência socioambiental sobre o consumo e a produção de resíduos? Quando o consumidor é minimamente consciente, procura dar a destinação adequada que proporcione a sua reciclagem, mas geralmente acompanhamos o descarte de entulho em vários locais da nossa cidade.
Esses entulhos acabam chegando a córregos, rios e nos oceanos. Como profissional da área urbanística, entendo tudo isso como o resultado de uma política mundial que força o consumo com o objetivo de movimentar a economia, mas, que não se importa com a sustentabilidade ambiental. Parece até que as indústrias apostam em um planeta descartável!
Aliado a isso, vemos o descaso com os cidadãos que são levados a comprar cada vez mais produtos (alguns totalmente desnecessários) de qualidade duvidosa, pouco duráveis e por preços normalmente abusivos. Tudo isso favorecendo o enriquecimento de uma pequena parcela de empresários.
Há países, como a França, em que “obsolência programada” é crime, sabia? Os franceses ainda lançam mão de um site onde os produtos são classificados dos “mais duráveis” aos que necessitam de frequentes reparos. Pelo site também é possível aprender a fazer consertos em aparelhos domésticos. O objetivo é, além de alertar a população, reduzir a produção de lixo eletroeletrônico e, consequentemente, da poluição.
No Brasil não temos qualquer regulamentação para coibir esse tipo de prática. Portanto, se o produto estragar, a probabilidade de não achar a peça é grande ou mesmo pode ser mais barato jogar fora e comprar um novo.
Imagine ter que comprar um ventilador novo porque a bobina queimou e o preço é quase o mesmo do produto na caixa? Ou porque não achou um copo que encaixe no liquidificador ultramoderno nas cores da moda? A tela do celular custar metade do preço do preço do novo e ainda estar em falta, o que fazer?
O instrumento legal previsto pela Lei 12.305 de 2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos Urbanos) hoje serve para facilitar o descarte, pois trata apenas da obrigatoriedade da coleta e destinação adequadas de certos produtos pelas empresas responsáveis (os fabricantes). Ainda assim, sabemos que essa lei não é aplicada.
Precisamos de uma nova política que regulamente a vida útil dos produtos para que sejam mais duráveis, mas que também envolva toda a sociedade, consumidores, indústrias e comércio. Não há um futuro possível para todos nós, neste planeta, sem que se estabeleça prática do consumo consciente e ambientalmente correto.
Jandira Maria Pedrollo, arquiteta e urbanista, membro da Academia de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso (AAU-MT), co-vereadora do Mandato Coletivo pela Vida e por Direitos.
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